“É fundamental continuar o trabalho em rede e tratar a violência como uma questão de saúde pública, para garantir o atendimento integral e humanizado à nossa população.”
Sônia Inácio dos Santos Rodrigues, chefe do Nupav da Região Central de Saúde
A professora Rosana (nome fictídio), 55, lecionou por muito tempo, mas conta que teve a carreira e a vida seriamente prejudicadas pela violência doméstica. Ao perceber que vivia uma relação abusiva, ela procurou ajuda médica e foi encaminhada à assistência no Cepav Margarida.
“Quando você vive episódios de violência, o seu organismo como um todo fica debilitado de diversas formas. É um sofrimento tão intenso, que a gente não consegue nem organizar os próprios pensamentos”, desabafa Rosana.
Com a ajuda do centro, a professora pôde alcançar a segurança e o apoio de que precisava. “No momento em que eu pisei aqui e tive o primeiro contato, senti como se o governo tivesse me segurado no colo e falado: ‘vamos resgatar a sua vida, nós estamos com você’”, descreve.
Etapas do acolhimento
No contato inicial, a equipe realiza um trabalho de escuta para entender a situação da paciente e identificar os tipos de cuidados físicos e psíquicos necessários. A partir dessa avaliação, começa o que os profissionais chamam de “primeira fase” do tratamento. Essa etapa consiste em atendimentos individuais agendados, preferencialmente em sessões quinzenais, junto à equipe do Cepav, composta por assistentes sociais, psicólogos, enfermeiros, clínicos gerais e ginecologistas.
“Muitas vezes é difícil de assimilar que você é vítima de violência doméstica. A partir do momento em que você é acolhida aqui, as pessoas te ouvem e você alcança o primeiro passo: o de reconhecer a situação em que estava vivendo e ter seus sentimentos validados”, relata Rosana.
Com a evolução do tratamento, os profissionais do centro começam a próxima etapa: reuniões em grupo para os pacientes em atendimento na unidade. Os bate-papos são temáticos e acompanhados de atividades criativas. O objetivo é encorajar a troca de histórias e reforçar o conhecimento sobre os tipos de violência, os canais de denúncia, os direitos da mulher e do cidadão e os locais onde procurar ajuda.
A assistente social Guaia Monteiro Siqueira, que atende em dois centros especializados, explica que os encontros grupais são o carro-chefe do serviço. “Com discussões sobre o medo, a culpa, os limites, a autopercepção e a autoestima, por exemplo, incentivamos os pacientes a trabalhar os verdadeiros focos: a nomeação, a ressignificação, a interrupção e, por fim, a superação da violência”, reforça.
Frente às dificuldades que podem afligir as vítimas e as marcas que a violência deixa como rastro, há preocupação da equipe em realizar uma busca ativa e, assim, garantir que os pacientes compareçam às consultas, participem dos encontros e não deixem o tratamento no meio do caminho. Nesse último caso, são oferecidas alternativas, como remarcação de horários e consultas virtuais.
O tratamento dura, geralmente, de seis meses a um ano, a depender das especificidades de cada paciente, com possibilidade de um período maior, se os profissionais e a vítima acharem necessário.
Com pouco menos de um ano de tratamento no Cepav, após passar por todo o processo, Rosana recebeu alta das sessões individuais e grupais. Atualmente, ela faz acompanhamento apenas com o médico da equipe e afirma que a passagem pelo centro foi um divisor de águas. “Hoje, eu me sinto mais fortalecida, mais segura e esperançosa, sabendo que meu futuro pertence a mim e que ele vale a pena”, comemora.
O desejo dela é que as demais pessoas em situação de violência tenham conhecimento do serviço gratuito oferecido gratuitamente pela saúde pública e saibam onde buscar auxílio. “Procurar ajuda profissional é fundamental. Contar com amigos e familiares é importante, mas não é o mesmo que o acompanhamento de especialistas das áreas relacionadas, como a saúde e a segurança”, reforça.
Cada flor, um amparo
As unidades do Cepav do DF são coordenadas pelo Núcleo de Prevenção e Assistência a Situações de Violência (Nupav), que também se divide em unidades,e amparados pela recém-estipulada Rede de Atenção às Pessoas em Situação de Violência do DF (RAV).
Mais conforto para vítimas de violência em São Sebastião
Com nomes de flores e plantas, as unidades oferecem acompanhamento a todos que buscarem ou forem encaminhados ao serviço. Alguns, inclusive, atendem a públicos específicos, como o Cepav Jasmim, que recebe crianças e adolescentes ofensores. Já o Caliandra, situado no Adolescentro, fornece apoio aos adolescentes vítimas de violência, e o Cepav Alecrim, por sua vez, recebe adultos ofensores encaminhados pelo Judiciário.
O cuidado, contudo, não termina quando a vítima recebe alta do tratamento, esclarece a chefe do Nupav da Região Central de Saúde, Sônia Inácio dos Santos Rodrigues. “A equipe tem o zelo de encaminhar os pacientes para vinculação na UBS de referência ou no Caps e ambulatórios de psiquiatria, se necessário”, explica.
Para ela, é preciso entender que a violência traz inúmeras consequências na vida. “Por isso, é fundamental continuar o trabalho em rede e tratar a violência como uma questão de saúde pública, para garantir o atendimento integral e humanizado à nossa população”, pontua.
Confira aqui os locais e horários de funcionamento das unidades do Cepav e saiba onde e como buscar ajuda.
*Com informações da Secretaria de Saúde