Um pisou feio na bola; o outro, no Brasil. Não se equivalem
Em 5 de setembro do ano passado, a menos de um mês de derrotar Bolsonaro no primeiro turno da eleição, Lula aproveitou um discurso que fez em São Paulo para comparar-se a Nelson Mandela, Mahatma Gandhi e Martin Luther King, alguns dos maiores líderes políticos do século XX, e todos pacifistas. Disse:
A modéstia não é o forte de Lula. Político é narcisista. Como não seria? Vive a pedir votos argumentando que é o melhor, que só ele fará bem ao povo. Ao citar Mandela, Gandhi e Luther King, mirou em Mandela, que depois de 27 anos preso se elegeu presidente da África do Sul, ganhou o Nobel da Paz e pacificou o país.
Lula sonha em ganhar o Nobel da Paz, que a ditadura militar de 64 impediu que fosse concedido a Dom Hélder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife. Mas Lula não é Mandela, assim como a conjuntura no Brasil guarda muitas diferenças com a da África do Sul à época da libertação de Mandela e do seu apogeu.
Mandela se elegeu com 62% dos votos contra 20% do segundo candidato mais votado, e 10% do terceiro. Lula venceu Bolsonaro pelo apertado placar de 50,90% dos votos válidos contra 49,10%. Ninguém contestou a vitória de Mandela; a de Lula foi alvo do golpe de 8 de janeiro e ainda é contestada.
Bolsonaro pode tornar-se inelegível por ter conspirado contra a democracia, coisa que Lula e o PT jamais fizeram ao longo de sua história. O bolsonarismo, porém, segue vivo e com a esperança de voltar a abocanhar o poder em 2026 se o governo Lula for um fiasco. Mandela teve maioria para governar; Lula ainda não tem.
“Eu não me incomodo mais com o fato da minha prisão” foi mais uma expressão do desejo de Lula à época do que verdade – à época e também hoje. Ele se incomodava e continua incomodado. Quem não se incomodaria de ter ficado 580 dias preso injustamente, segundo o Supremo Tribunal Federal?
Ele errou, e feio, não por ter desejado que Moro se ferrasse, mas por ignorar as fartas evidências de que Moro escapou de ser morto pelo crime organizado graças a uma operação da Polícia Federal, e justamente durante seu governo. Ressuscitou Moro, um senador apagado, e reanimou o bolsonarismo. Foi ruim.
Comparar Lula com seu antecessor, no entanto, é um grave erro. É não saber distinguir entre os dois Quem se lembrará daqui a alguns anos que Lula desejou mal a Moro? Quem se esquecerá do mal que Bolsonaro fez ao Brasil? Passou da hora de Lula esquecer Moro e Bolsonaro e começar a entregar ao país o que prometeu.