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O Grande Mudo (leia-se: o Exército) cala-se para esconder a verdade

Braço forte, pode ser… Quanto a mão amiga…

Orlando Brito

Convenientemente, o Exército, chamado de O Grande Mudo, perdeu a voz. Digo que perdeu porque todas as vezes que lhe pareceu conveniente, falou, falou alto, causando graves danos à democracia. Sim, pois apesar de se dizer mudo, o Exército fala.

Falou para levar Getúlio Vargas ao poder em 1930. Vargas governou como ditador até 1945. Acabou deposto pelos militares. Acabou voltando em 1950 nos braços do povo. Matou-se quatro anos depois sob pressão de O Grande Mudo para que renunciasse.

Juscelino Kubitschek, eleito presidente em 1956, enfrentou duas rebeliões militares. Dele, Carlos Lacerda, líder da direita armada e desarmada, disse que não poderia ser candidato; se fosse, que não poderia se eleger; se eleito, não deveria governar.

Foi um Jânio Quadros de porre que renunciou à Presidência com apenas seis meses de mandato. Diante da oposição militar à posse do vice, foi preciso trocar o presidencialismo pelo parlamentarismo. João Goulart foi derrubado três anos depois.

Este país viveu 21 anos sob uma ditadura militar. A democracia foi suprimida a pretexto de defendê-la do comunismo. Torturou-se e matou-se adversários do regime. O Grande Mudo negou que houvesse tortura e matança. Farta documentação prova que houve.

Com o fim da ditadura, o Exército passou a falar em voz baixa. Mas nunca parou de falar. Falou sobre o tamanho do mandato do presidente José Sarney: queria cinco anos e a Constituinte só queria dar quatro; deu cinco, para afastar a ameaça de golpe.

Falou contra a instalação da Comissão da Verdade para apurar os crimes da ditadura. Falou contra a concessão de habeas corpus a Lula que estava preso e poderia ser solto – e por 4 votos contra 3, o Supremo Tribunal Federal negou o habeas corpus.

Falou, fingindo que era mudo, para eleger Bolsonaro presidente. E a favor dele, falou nos últimos quatro anos para respaldá-lo e, se possível, reelegê-lo. Não perdeu a voz sequer quando Bolsonaro foi derrotado, abrigando à sua porta os golpistas do 8 de janeiro.

Se o Exército é devoto da Constituição, se falou quando não deveria, por que não fala agora sobre a participação de diversos dos seus membros na tentativa mais recente de golpe e na roubalheira das joias presenteadas ao Brasil e surrupiadas por Bolsonaro?

Não vale a desculpa de que não fala em casos sob investigação. É mentira. No 1º de maio de 1981, militares plantaram bombas para matar quem assistia a um show de música no Riocentro. Uma bomba explodiu no colo de um dos terroristas, matando-o.

O Grande Mudo montou um falso inquérito para concluir que a culpa era da esquerda. Outro falso inquérito de 1975 concluiu que o jornalista Vladimir Herzog se enforcou numa dependência do Exército, em São Paulo. Mentira. Ele morreu sob tortura.

Por que o Exército, no mais das vezes, só fala para esconder ou mentir? E por que ignora ocasiões em que poderia falar a verdade? A doutrina da mudez política do Exército, uma invenção francesa do início do século passado, nunca prosperou por aqui.

O grito oficial de guerra do Exército brasileiro é: “Braço forte, Mão amiga”. Grande Mudo: cadê a mão amiga da verdade? Foi amputada? Nunca existiu? Seu patrono, Duque de Caxias, sentiria vergonha se fosse vivo.

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